quinta-feira, 30 de abril de 2015

OS EDITAIS DE CULTURA E A CULTURA DE RESULTADO

Wilson Coêlho

"Nem todos os gestos são gestos sociais. A atitude de defesa perante uma mosca não é, em si própria, um gesto social; a atitude de defesa perante um cão pode ser um gesto social, se através dessa atitude se exprimir, por exemplo, a luta que um homem andrajoso tem que travar com os cães de guarda." Bertolt Brecht
Quando o governo e a imprensa, a serviço da classe dominante, fingem desconhecer as diferenças entre cultura, arte e a questão social, apesar de seus parentescos e interdependências, todo discurso está fadado a embromação. A última reunião do CEC – Conselho Estadual de Cultura, realizada aos 9 de abril p. p., foi um fiasco ou, no mínimo, bizarra. Apesar do título estampado na primeira página do Caderno Dois (A Gazeta, 13/04/2015), a reunião do CEC não foi nada polêmica, considerando que o polêmico vem de pólen que tem a ver com a criação, no sentido da reprodução, ou seja, não passou de um encontro em que o governo simulou uma espécie de “queda de braço” para testar até que ponto o movimento cultural está atento e como o estado vai se organizar para impor o seu projeto autoritário para justificar sua incompetência em discutir de verdade políticas públicas de cultura com a sociedade. Isso soa absurdo, considerando que se o governo estivesse realmente interessado em atender à demanda do movimento cultural, teria apenas que convocar os segmentos organizados da sociedade para definir as prioridades e colocar em ação o que já está definido no PEC – Plano Estadual de Cultura, votado no ano passado pela Assembleia Legislativa do Espírito Santo.
Para dar alguns exemplos da bizarrice da última reunião do CEC, tanto do governo quanto da imprensa, gostaria de fazer alguns destaques. Da imprensa, por exemplo, afirma que a reunião contava com “cerca de 80 pessoas, incluindo sociedade civil”, como se a sociedade civil não fizesse parte do Conselho que é paritário. Obviamente que também entendemos que o CEC não passa de um mero apêndice da Secult – Secretaria de Estado da Cultura do ES. Outro blefe, tanto da imprensa quanto do governo é fazer um discurso ornamental sobre “economia criativa” que, no fundo, tem como única pretensão transformar toda e qualquer manifestação artística e cultural em produto de mercado. Também não podemos olvidar que, conforme o jornal, “de modo geral, a transversalidade foi bem recebida pela classe artística...”
Numa meia sentença, dois grandes equívocos. Primeiro, a chamada “transversalidade”, além de não ser aceita pela maioria, chegou atravessada como um engodo para justificar a supressão de alguns editais, além de alijar os municípios do interior do estado. Segundo, tratar os artistas e a comunidade cultural como “classe artística”, (não quero usar adjetivos) é muito estranho. Não existe classe artística. Recapitulando: numa sociedade dividida em classes, como é o caso da nossa, somente existem duas classes, a saber: uma dominante (opressora) e, outra, dominada (oprimida). Tem gente que acha que estes termos são coisas do passado por não perceber como se camuflam as formas de dominação para que os dominados não percebam. Nos tempos que correm, por exemplo, empregada doméstica parece pejorativo, dai, o nome vem sendo substituído por secretária. Mas a relação entre o dominador e a subalterna continua a mesma.
Outra coisa que não ficou nada clara e nem convincente sobre os editais foi a questão do corte de orçamento na pasta da cultura, de R$ 105,7 milhões para R$ 33,9 milhões. Como é de domínio público e como o próprio secretário confirma, o montante cortado do orçamento da cultura foi praticamente do que diz respeito a verba que vinha sendo destinada ao Cais das Artes. Sendo assim, a redução do orçamento dos editais se dá mais por um descaso e despreparo no trato com a cultura e a arte. Ao mesmo tempo, foi anunciado que o orçamento para a ação social é de R$ 69 milhões.
Por um lado, apesar de um valor irrelevante no que deveria ser destinado à cultura, levando em conta a arrecadação do estado e, deste volume, menos de 7 milhões seria destinado aos editais, há um agravante: os membros do CEC não têm a mínima informação de como serão utilizados os outros 26 milhões. Nenhuma informação para a sociedade sobre os limites entres as atividades fins e as atividades meios. Por outro lado, a Ação Social, com os seus 69 milhões, também se nos parece outra incógnita sobre como os mesmos serão utilizados. Ademais, há uma tônica em que os projetos da cultura estejam vinculados aos projetos sociais. Sustentado pela lógica do disparate e no uso de suas atribuições, o secretário diz que “a política de editais não é para premiar artistas consagrados, mas para dar chance aos talentos emergentes.” 
Será que em vez de falarmos de política de editais (sic) não seria melhor dizermos que os editais que existem não passam de uma forma de escamotear a falta de políticas públicas para a cultura? Quando o secretário acrescenta que “a verba é razoável” fica ainda mais confuso. Podemos dizer que tudo é razoável, apenas pelo fato das coisas terem uma razão de ser ou que determinada coisa foi raciocinada. Mas esta afirmação assim solta não diz ao que veio. Vale ressaltar que a cultura tem sua demanda e, especialmente quando manifestada através da arte, requer muitos cuidados e apoio para a formação, capacitação, qualificação, criação e circulação das obras produzidas. Mas devemos pensar que muitas das vezes a arte e a cultura estão em oposição, entendendo que a cultura tem o compromisso de cultivar, cultuar e/ou render culto ao que é, ao passo que a arte, apesar de oriunda no tempo e no espaço que se definem numa determinada cultura, surge como uma necessidade de e a partir das inquietudes humanas, colocar em xeque aquilo que é cultuado. A arte e a cultura, tanto pelo governo quando pela mídia local, são sempre usadas como se uma fosse sinônimo da outra, mas elas não são. Numa sociedade capitalista e, obviamente, dividida em classes, tal “engano” é proposital, tendo em vista que confundir arte com cultura significa colocar as duas na condição de mercadoria. Desta forma, a arte aqui não é vista para além de uma cultura de resultados.
Assim, soa absurdo que a secretaria de cultura com um orçamento de R$ 33,9 milhões, onde somente 6 estejam destinados aos projetos culturais da sociedade, queira deixar os artistas e agentes culturais duas vezes reféns. Primeiro, porque – no lugar de uma política pública de cultura – cria editais no modelo de mercado onde os interessados devem “competir entre si”, como na velha cartilha do laisse-faire. Depois, porque – além dos insuficientes recursos e pulverizados projetos – ainda “orienta” a finalidade dos projetos culturais para atender a demanda da Ação Social que conta com recursos bem maiores e que, diga-se de passagem, até agora não sinalizou nenhuma preocupação ou maiores compromissos com a cultura e que sequer sabemos como será utilizado o orçamento.


NADA DE NOVO NO FRONT

Wilson Coêlho
Apesar de você/ Amanhã há de ser/ Outro dia
Inda pago pra ver/ O jardim florescer
Qual você não queria/ Você vai se amargar
Vendo o dia raiar/ Sem lhe pedir licença
E eu vou morrer de rir/ Que esse dia há de vir
Antes do que você pensa. Chico Buarque

Faz-se necessário recorrer à memória para entendermos que os editais de cultura da Secult-ES não estão em separado da conjuntura e da política neoliberal do governo do Espírito Santo. Sem querer ser didático, parece ser interessante montar alguns dados. Paulo Hartung é o governador do estado do Espírito Santo e, a famigerada Secult-ES, órgão desmoralizado, sem orçamento e sem nenhum poder, não passa de um órgão a serviço deste governo, principalmente no que diz respeito a sua tarefa de fortalecer ainda mais e favorecer os empresários, como uma estratégia de sucatear a “res publica”. Recordar é viver. A arte e a cultura, para Paulo Hartung, desde sua eleição para o DCE – Diretório Acadêmico dos Estudantes da UFES, em tempos remotos, dizem seus contemporâneos do movimento estudantil que não eram de seu grupo, sempre foram entendidas como meras ações utilitárias com fins eleitoreiros. Uma ação cultural, para o dito cujo, nunca deveria ser realizada com autonomia, mas com o objetivo único de referendar e “embelezar” as propostas de seu grupo que, diga-se de passagem, muitos de seus integrantes compõem seu atual governo.
Caminhando um pouco mais e, embora de forma resumida, cabe recordar o tempo em que foi prefeito de Vitória, eleito depois da administração de Vitor Buaiz que, de certa forma, foi referência nacional, com a criação da Escola de Artes FAFI, da lei de incentivo “Rubem Braga”, a segunda do Brasil e, entre outras coisas, destaque pela atuação do Conselho Municipal de Cultura, a urbanização da Grande São Pedro, cultura nos bairros, etc.
Pois bem, Paulo Hartung eleito prefeito de Vitória, apesar de ter dado posse aos conselheiros eleitos na administração anterior pela sociedade civil, o atravancou com o retardo da convocação das reuniões e, com muita má vontade, se propunha a liberar o mínimo estabelecido na Lei “Rubem Braga” para a aplicação dos recursos de incentivo à produção cultural. Depois, para lhe suceder, ainda inventou Luís Paulo Velloso Lucas, não somente para dar continuidade do seu projeto, mas também para emperrar mais a cultura, reafirmando a Secretaria Municipal de Cultura como simples aparelho a serviço do neoliberalismo que além de trazer como secretária municipal de cultura uma estrangeira, Cláudia Cabral, vindo do Rio de Janeiro, ainda acabou terceirizando a gestão da Escola de Teatro e Dança FAFI.
Mais tarde, tendo sido eleito em 2002, Paulo Hartung assumiu o governo do estado em 2003 e, aos 31 de março do mesmo ano, revogou a lei de Incentivo Fiscal para a Cultura que havia sido aprovada em 2000 pelo seu antecessor José Ignácio. Em julho de 2003, desarticulou e desativou o CEC – Conselho Estadual de Cultura. Em 24 de julho de 2008, no seu segundo mandato, publicou um decreto vetando o Estado de celebrar convênios. Em seguida, aos 7 de agosto de 2008, reestrutura a seu modo o CEC e dá posse aos conselheiros. Aos 25 de agosto de 2008, celebra o Contrato de Competitividade com as empresas do comércio atacadista. É criado o Instituto Sincades para manipular verbas públicas sem necessidade de prestação de contas.
Alimentando uma falácia, conforme publicado pelo governo, “este Contrato de Competitividade estabelece o compromisso das partes em aumentar a competitividade das empresas do Comércio Atacadista estabelecidas no Estado do Espírito Santo, em relação às similares de outras regiões do país. Em contrapartida aos incentivos tributários concedidos pelo Governo do Estado, o setor pactuante se compromete a investir em ações que resultem em seu próprio desenvolvimento socioeconômico e sustentável. O objetivo é garantir a manutenção e criação de empregos, ocupação, renda e evolução na capacitação profissional da população local, simultâneo a incrementação na capacidade comercial atacadista do setor.”
Ainda confere aos empresários o poder da destinação interestadual dos produtos, onde “O estabelecimento comercial atacadista estabelecido neste Estado poderá a cada período de apuração estornar do montante do débito registrado por ocasião das saídas interestaduais o percentual equivalente a trinta e três por cento (33%), de forma que, a carga tributária efetiva máxima resulte no percentual de um por cento (1%)”.
Trocando em miúdos, conforme a reunião do dia 24 de Janeiro de 2013, com a “Prestação de Contas do Instituto Sincades”, que foi uma reivindicação dos Conselheiros do CEC desde sua reestruturação, ficou muito claro que o governo de Paulo Hartung abriu mão de onze por cento (11%) dos 12 que deveriam pagar os atacadistas de ICMS. Essa renúncia fiscal ou concessão se sustentava da mentira de que estas empresas investiriam para aumentar sua “competitividade no mercado”. O que parece muito claro é que tudo não passou e não passa de uma farsa, considerando que nem os cofres públicos capixabas se beneficiaram desse “acordo”, tendo em vista que em nada alteraram os preços das mercadorias para o cidadão capixaba, não gerou empregos e apenas favoreceu as aventuras do Instituto Sincades de promover eventos faraônicos e sem a participação do movimento cultural do nosso estado.
Voltando à questão da conjuntura, podemos avaliar algumas outras questões. Será possível acreditar que o Espírito Santo ser o segundo lugar na criminalidade do Brasil esteja separado da forma como o Estado lida com a sua cultura? Será que o estado com o maior índice de assassinato de mulheres no Brasil não tem nada a ver com o descaso que o governo trata a sua cultura? Parece que o tema dos editais de cultura não passa da ponta de um iceberg que congela os sonhos dos capixabas que pensam num mundo melhor e mais humanitário. E, ainda, voltando ao chamado impasse entre as propostas do governo em contradição com os anseios do movimento cultural, a Secult propõe reuniões isoladas com segmentos culturais. Outra demonstração de autoritarismo e falta de vontade política em colocar na mesa as verdadeiras questões para se desfazer alguns impasses. Creio que o mais honesto seria um fórum aberto com toda a sociedade para que nós da sociedade civil pudéssemos fazer cair as máscaras desse governo que faz acordo com empresários como se não existisse a sociedade civil. Não é por acaso que o Espírito Santo é visto como uma espécie de filho bastardo da região sudeste.

Enfim, creio que se faz necessário ampliar os debates e posicionamentos das entidades locais, bem como uma mobilização e envolvimentos das entidades nacionais para que a imagem do Espírito Santo não seja refém de uma imprensa comprometida com os segmentos tradicionais e reacionários do empresariado que faz de todos nós apenas o canteiro de seus lucros e manutenção de seus domínios.
DOS EQUÍVOCOS
                                                                                         Wilson Coêlho

Como diziam os antigos, “boca fechada não entra mosquito”. É o que constatamos a cada vez que o governo do estado faz uma tentativa de defender o indefensável. Vamos aos equívocos. Quando o secretário defende o Instituto Sincades (Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor do Espírito Santo) e afirma que “as pessoas acham que não pode haver recurso da iniciativa privada em política pública”, é como se ele dissesse – tomando emprestado uma fala de Doutor Pangloss, personagem de “Candido ou o otimismo”, de Voltaire fazendo uma crítica à filosofia de Leibniz – que os narizes foram feitos para usar óculos, e por isso nós temos óculos.

Para início de conversa, há uma confusão entre público e privado e, principalmente, sobre política pública, considerando que o governo não tem uma política pública de estado no que tange a cultura, ou seja, trata-se de uma política de um governo que desde a sua candidatura está comprometida com os acordos feitos com o empresariado praticante do oligopólio. O Sincades é por si mesmo a crônica de um crime anunciado, pela maneira e pelos propósitos pelos quais foi criado. Se para o governo ele pode ser considerado legal, para o bom senso ele é imoral, tendo em vista que faz parte de um acordo entre governo e empresariado sem passar pelo debate com a sociedade civil, principalmente no que diz respeito à cultura, tendo em vista que o mesmo desenvolve projetos particulares na casa de aproximadamente 70 milhões de reais por ano e, diga-se de passagem, sem precisar prestar contas ao povo e, tampouco ao governo que lhe assinou um cheque em branco.

Agora, convenhamos, como é que o secretário tem o disparate de chamar de “doação” o montante da verba da cultura a ser aplicada pelo Sincades nos editais de incentivo à cultura? Como pode alguém doar o que não lhe pertence? Depois, que política pública de cultura para uma secretaria que não tem uma dotação orçamentária capaz de atender à demanda da sociedade e, tampouco, tem autonomia?

Para confirmarmos de vez a prepotência e a tamanha ignorância deste governo quanto ao movimento cultural de nosso país, tendo como porta-voz um secretário weberiano, podemos recorrer a outra de suas afirmações. Num dado momento, conforme a imprensa a serviço do estado, não sei se por desconhecimento ou má-fé, ele diz que “todo mundo que está ali (na discussão sobre os editais) pega dinheiro com a Rouanet, que é recurso privado”. Estupidamente equivocado. Muito rarissimamente algum artista capixaba se socorre da Rouanet, por alguns motivos, mesmo que todos os projetos enviados a Rouanet sejam aprovados. Se algum candidato tem algum problema na elaboração do projeto, ele é devolvido tantas vezes quanto for necessário para que ele seja acertado. Assim, todos são aprovados. Mas tem um impasse: nenhum deles consegue captar recursos, principalmente do empresariado capixaba, exceto, quando coincidir que algum artista tenha um amigo empresário interessado em ajuda-lo, não por uma valorização da arte, mas por motivos quase afetivos.

Obviamente, alguns imbecis podem querer desmentir essa fala dizendo que existem sim projetos capixabas aprovados e captados pela Rouanet. Mas eu duvido que consigam provar, exceto, se – conforme dito antes – for numa relação de amizade entre artista e empresário. De outro modo, também não dá para esquecer que realmente existem muitos e ricos projetos realizados pela Rouanet nos territórios capixabas, mas esses são outros quinhentos. São produtores fraudulentos que fazem acordos silenciosos entre empresários, prefeitos, governados, deputados e vereadores, para festas de cidade, torneios, carnavais e uma infinidade de eventos onde estão incluídas verbas milionárias para cantores e bandas medíocres, aluguel de palcos, tendas, lonas de circo, trios elétricos e o escambau.

No mais, ainda no campo das ignorâncias, seria muito interessante que o governo local tomasse consciência do andamento e dos movimentos que o ministro da Cultura, Juca Ferreira, tem organizado Brasil afora e com recente reunião no Senado, para garantir a aprovação do projeto Procultura que, além de já aprovado na câmara e de substituir a Rouanet, aumenta a distribuição dos recursos de incentivo à cultura e fortalece o norte e o nordeste do país. Um grande passo para acabar com o patrocínio do Estado para obras comerciais, essas que fazem o discurso do mercado, mas querem se apropriar das conquistas públicas da sociedade civil.

domingo, 30 de agosto de 2009

Processo de criação

55 27 99389794

FENOMENOLOGIA NO PROCESSO DE CRIAÇAO TEATRAL


FENOMENOLOGIA NO PROCESSO DE CRIAÇÃO TEATRAL


Wilson Coêlho


“Parece que onde reinam a simplicidade
e a ordem não pode haver teatro nem drama,
e o verdadeiro teatro nasce, como a poesia
–embora por outros caminhos–
de uma anarquia que se organiza,
depois de lutas filosóficas que são o lado
apaixonante dessas primitivas unificações.”
Antonin Artaud

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Wilson Coelho


55 27 9938-9794